quinta-feira, janeiro 25, 2007

Espanha vai adaptar tamanhos de roupa à mulher real

Acordo com indústriaEspanha vai adaptar tamanhos de roupa à mulher real 25.01.2007 - 08h11 Catarina Gomes , PÚBLICO

Quem sempre usou umas calças 36 e agora não cabe numas 38 decide fazer dieta; se essa mesma pessoa entra numa outra loja e só consegue vestir umas 40, então cria mesmo a ideia de que tem ganho peso a olhos vistos. Mas estas aparentes mudanças de tamanho podem ser mera ilusão. O Governo espanhol decidiu medir 8500 espanholas e chegar a um tamanho médio para uniformizar de forma realista os tamanhos de roupa vendida para mulheres.
A iniciativa foi do Ministério da Saúde espanhol; aderiram ao acordo de auto-regulação, a ser aplicado ao longo de cinco anos, os grandes grupos de vestuário, desde a Inditex (que inclui a Zara, a Massimo Dutti e a Pull and Bear) à Mango ou El Corte Inglês, entre outros. Ao todo, 80 por cento do sector, anunciou a ministra da Saúde e do Consumo, Elena Salgado, que quer mais tarde alargar a mesma medida à roupa de homem, noticiava ontem o jornal El País.A medida é de saúde e pretende trazer realismo aos tamanhos de roupa, que têm como padrão um modelo de beleza que privilegia as mais magras e que é inalcançável para a maioria da população, reconhece o Governo. E que, em casos extremos, pode mesmo conduzir a transtornos de saúde graves."Não é razoável que numa sociedade moderna e avançada se criem estereótipos de beleza desfasados da realidade. É um compromisso de todos que a beleza e a saúde andem de mãos dadas", declarou a ministra, citada pelo El Mundo.É assim que neste pacote de medidas o tamanho 46 perde o estatuto de tamanho especial e passa a normal e os manequins de montra passam a não poder vestir abaixo do 38. A ideia é promover uma imagem saudável e adaptada à população.Medida exclui PortugalO Instituto do Consumo espanhol vai iniciar este ano um circuito por Espanha em busca da mulher média. Para isso vai medir 8500 mulheres entre os 12 e os 70 anos.A medida não abrangerá o mercado português, esclareceram responsáveis da Mango e do El Corte Inglés. Mas o trabalho em Portugal está feito: mais de 40 por cento das portuguesas vestem o número 40. Se forem analisadas as mulheres mais velhas, os tamanhos usados ainda são maiores, refere a endocrinologista Isabel do Carmo, que coordenou um estudo nacional - sobre a prevalência do excesso de peso - da Faculdade de Medicina de Lisboa. Mas muitas das lojas vendem apenas tamanhos dirigidos a jovens. Estas clientes, "uma fatia pequena da população", dão "um aspecto mais atraente, mais juvenil às lojas". A médica afirma que o comércio está assim a "estigmatizar e marginalizar" a larga maioria da população feminina, que veste acima dos 40."A intenção dos espanhóis é ajustar os números à realidade", o que funciona como "um factor preventivo da baixa auto-estima" para pessoas que nunca encaixam nos tamanhos ideais, nota ainda Isabel do Carmo. Poderá fazer com que "a mulher se sinta melhor no acto de compra", complementa Osvaldo Santos, psicólogo que também participou no estudo da Faculdade de Medicina de Lisboa.A medida está longe de servir para prevenir distúrbios alimentares, como a anorexia, refere Paulo Machado, professor da Universidade do Minho, que fez um estudo nacional sobre o problema. A anorexia "é um fenómeno mais complexo", que envolve factores genéticos, psicológicos e sociais. Mas "fazer dietas é um dos factores de risco para distúrbios alimentares", admite.Pedro Teixeira, professor de nutrição na Faculdade de Motricidade Humana, em Lisboa, não acredita que a decisão espanhola tenha impacto na diminuição deste tipo de distúrbios. Mas não deixa de ser importante: "Envia um sinal claro do Governo de que as pessoas têm direito a roupas bonitas para todos os tamanhos." Ao mesmo tempo, condena "as modificações artificiais dos tamanhos", centradas nos números mais pequenos, que criam "descontentamento face à auto-imagem corporal".Evitar a culpabilizaçãoPedro Teixeira admite que o ideal seria que todas as mulheres vestissem o 38, porque "a obesidade faz mal à saúde". Mas não é produtivo "fazer as pessoas sentirem-se culpabilizadas". Ao mesmo tempo, aquelas que têm excesso de peso sabem-no e medidas como as do Governo espanhol criam "a aceitação social" de um problema potenciado pela própria sociedade.Mais uma vez Espanha assume a vanguarda deste tipo de opções. Foi nas passerelles madrilenas que no ano passado foi proibida a participação de modelos demasiado magras. A iniciativa foi depois imitada em Milão e Roma.