domingo, dezembro 24, 2006

O misterioso poder da oração




O neurologista Andrew Newber da Universidade da Pensilvânia tirou fotografias daquilo a que os fiéis chamam de presença de Deus. Os resultados, publicados na edição de 10 de Abril da revista Psychiatry Research "Neuroimaging", foram surpreendentes.
Foram convidados budistas e freiras franciscanas a meditarem e rezarem numa sala fechada. Depois, no momento da mais alta devoção, injectou um marcador que viaja até o cérebro e revela sua actividade no momento da transcendência.
Um padrão emergiu das experiências de Newberg: Existe uma pequena região, na parte posterior do cérebro, que calcula constantemente a orientação espacial da pessoa, dando uma ideia de onde o corpo da pessoa termina e o resto do mundo começa. Durante a oração intensa ou meditação, essa região torna-se um oásis tranquilo de inactividade, por razões ainda inteiramente desconhecidas.
Tal poderia explicar a comunhão espiritual de ausência de limites, sentida pelos religiosos ao longo das eras. Aliás, "se forem sufientemente longe, os praticantes têm uma dissolução completa do eu, uma sensação de união, de espaço infinito".
Fenómenos biológicos
Os cientistas estão a chegar à conclusão que as diversas tradições de devoção humana têm uma realidade biológica poderosa. Durante a meditação ou oração, tanto o cérebro quanto o corpo experimentam mudanças ainda pouco compreendidas, que poderiam trazer nova compreensão da experiência religiosa e, talvez um dia, até fornecer dicas para se viver com mais saúde e plenitude.
Segundo os especialistas, o novo campo de estudo já forneceu evidências de que esses estados meditativos - que dependem do desligamento dos sentidos e de repetição de palavras, frases ou movimentos- são uma parte natural do cérebro. E que os humanos são, em certo sentido, seres inerentemente espirituais.
"A oração é o meio que o cérebro moderno tem para se ligar a estados de consciência ancestrais poderosos", disse Gregg Jacobs, professor assistente de psiquiatria na Escola de Medicina de Harvard.
Durante a meditação, os pesquisadores observaram um aumento na actividade das ondas cerebrais "teta", um tipo que se move lentamente e que inibe outras actividades do cérebro. Com base numa análise preliminar de dados recentes, Gregg disse que observou a actividade dessa onda inibidora a sair de uma área do cérebro, chamada de lobo parietal, que contém o oásis tranquilo da prece. Eventualmente, os pesquisadores esperam poder identificar um centro biológico comum nas muitas variedades mundiais de adoração.
Será que a ciência desvenda o mistério?
À medida que os cientistas adoptam tecnologias cada vez mais sofisticadas para o estudo da religião, muitos advertem que esses primeiros vislumbres do território misterioso não devem ser excessivamente interpretados.
"O que quer que possamos aprender sobre esses estados será uma grande vantagem para nós", disse Lawrence E. Sullivan, director do Centro de Estudos das Religiões Mundiais de Harvard. Há o perigo, entretanto, "de que nossa tecnologia e conclusões não se igualem à complexidade da religião". A própria oração é espectacular na diversidade, disse Sullivan, citando a tradição Taoista de meditação profunda, na qual os praticantes imaginam o seu próprio nascimento.
Nos anos 1970, alguns pesquisadores começaram a estudar seriamente o valor terapêutico da religião. Herbert Benson, presidente do Instituto Corpo/Mente afiliado à Universidade de Harvard, cunhou a expressão "resposta de relaxamento", para descrever as mudanças psicológicas saudáveis nas pessoas que seguiam práticas meditativas orientais.
Uma das mais impressionantes descobertas aconteceu em 1997, quando uma equipa de pesquisadores da Universidade da Califórnia, descobriu o que chamaram de "módulo Deus", no cérebro. Estudaram pacientes que sofriam de uma forma de epilepsia que afecta o lobo temporal do cérebro. Esses pacientes têm experiências profundamente religiosas durante os acessos e depois ficam fascinados com assuntos místicos.
Os pesquisadores, chefiados por Vilayanur Ramachandran, disseram que os acessos fortaleciam uma porção do cérebro que responde a palavras religiosas, implicando que o sentimento religioso é parte da arquitetura cerebral.
Ninguém sabe ainda, entretanto, porque razão o cérebro tem essa habilidade milagrosa de atingir outros tipos de estados de consciência, simplesmente voltando-se para dentro, aquietando-se, concentrando-se numa imagem trêmula e repetindo uma frase sagrada.
Algumas pessoas interpretarão os resultados da pesquisa como evidência de que Deus é um produto do cérebro, enquanto outras dirão que são evidência de que o cérebro é um produto de algum poder maior que, como diz Benson, " talvez Deus nos tenha dado o mecanismo para entender e sentir Deus de determinada forma".
(Baseado num artigo de Gareth Cook)